Mundo – O decreto de reformas econômicas do presidente da Argentina , Javier Milei, tem como um de seus objetivos acabar com a contribuição sindical obrigatória no país. Segundo o texto, enviado ao Congresso na 6ª feira (22.dez.2023), os trabalhadores deverão dar uma autorização explícita para que uma porcentagem da contribuição seja descontada do seu salário.

Entre outras medidas, o decreto (íntegra – PDF – 425 kB) acaba com as chamadas “taxas solidárias”, ferramenta de arrecadação para os sindicatos que estabelecem descontos obrigatórios para todos os trabalhadores de uma atividade, filiados ou não à organização sindical.

Atualmente, os trabalhadores argentinos são descontados mensalmente em 17% dos seus salários pelo Estado. Os descontos são divididos entre:

Aposentadoria: 11% do salário bruto (lei 24.241/1993);
Serviço Social: 3% do salário básico convencional (lei 23.660/1988);
Assistência Médica: 3% do salário bruto (lei 19.032/1971).

Além disso, também são aplicados a todos os funcionários de uma categoria um desconto mensal destinado para o sindicato que representa a classe, que decide em assembleia o percentual das contribuições, conforme o artigo 20 da lei 23.551/1988. O SEC (Sindicato dos Empregados do Comércio), por exemplo, retém 2% do salário de associados.

O decreto de Milei mantém a tributação de 17% para cobrir as despesas de caráter social, mas acaba com a obrigatoriedade do desconto adicional mensal no salário de todos os trabalhadores para repassar recursos aos sindicatos correspondentes.

A partir da nova regra, só os trabalhadores formalmente sindicalizados é que terão o desconto mensal para ser repassado às agremiações sindicais. Todos os demais ficariam sem pagar essa taxa extra.

A proposta enfraquece os sindicatos, que terão um corte abrupto em suas receitas. Não está claro nem foram divulgadas estatísticas confiáveis sobre o número total de trabalhadores sindicalizados na Argentina —os que continuariam a contribuir para as suas associações de classe mensalmente.

ENTENDA A TRAMITAÇÃO

O modelo de decreto apresentado por Milei, chamado de DNU (Decreto de Necessidade e Urgência), é de uso exclusivo da Presidência. É permitido em casos em que haja circunstâncias excepcionais que impeçam o procedimento normal de promulgação de leis pelo Congresso. Mas não pode tratar de normas que regulem matéria penal, tributária, eleitoral ou político-partidária.

Assim que publicado, o decreto precisa ser enviado à Comissão Bicameral Permanente de Processo Legislativo do Congresso, composta por 8 senadores e 8 deputados, em até 10 dias. A comissão deve analisar, também em um prazo de 10 dias, se o decreto cumpre requisitos de teor e de relevância para a imposição da urgência. Após o fim desse prazo, um parecer sobre o decreto deve ser enviado à Câmara e ao Senado, que precisa então analisar e aprovar o decreto por maioria simples.

Contudo, a análise das medidas de Milei deve ser fatiada e conduzida pelo Congresso em caráter extraordinário a partir desta 3ª feira (26.dez) até 31 de janeiro de 2024, segundo o jornal Clarín. O período costuma ser de recesso no Legislativo argentino. Entre as medidas estão a lei de reforma do Estado, a cédula única de votação e a anulação da medida que aumentou a isenção do Imposto de Renda. Entenda mais nesta reportagem.

O partido de Javier Milei, o La Libertad Avanza, é minoritário no Congresso da Argentina: tem 38 dos 257 deputados na Câmara e 7 dos 72 no Senado. Para ter maioria dos votos nas Casas é preciso, respectivamente, de 257 deputados e 37 senadores.

SEMELHANÇAS NO BRASIL

A ideia de Milei é similar ao que foi proposto no governo do ex-presidente Michel Temer em 2017. À época, Temer sancionou uma reforma trabalhista que extinguiu o imposto sindical.

A lei aprovada por Temer diz que a contribuição tem de ser autorizada “previa e expressamente” pelo trabalhador, assim como a proposta do presidente argentino.

No Brasil, esse entendimento prevaleceu até o 2º semestre de 2023. Em 11 de setembro, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu por 10 votos a 1 a constitucionalidade da chamada contribuição assistencial para sindicatos. Trata-se de uma cobrança que terá um impacto semelhante ao antigo imposto sindical, que vigorou até 2017 e dava mais de R$ 3 bilhões por ano para sindicatos e centrais.

Em outubro, houve mais 1 capítulo sobre a retomada dessa cobrança aos trabalhadores no Brasil. Isso porque a CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado Federal aprovou o PL (projeto de lei) 2.099 de 2023 que impede os sindicatos de exigirem o pagamento de contribuição sindical, assistencial ou de qualquer outra taxa sem autorização do empregado.

No texto aprovado no colegiado, ficou determinado também que a contribuição vinculada à negociação coletiva só pode ser cobrada uma vez ao ano e na vigência do acordo ou convenção. O projeto também obriga os sindicatos a dar ampla publicidade ao direito de oposição por todos os mecanismos disponíveis, como em sites na internet, aplicativos de mensagens ou e-mails.

O PL ainda está em tramitação na Casa Alta e deve ser uma das principais pautas de negociação entre o Senado e o Ministério do Trabalho. Poucos dias depois da aprovação do projeto na CAE, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, disse que o imposto sindical “não volta mais” e que a taxa será negociada entre os trabalhadores e os sindicatos.

Fonte: Poder 360