O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) decidiu recorrer da decisão da Corte sobre um relógio recebido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2005, presenteado pelo então presidente francês Jacques Chirac. O temor é que essa decisão possa abrir uma brecha para que Jair Bolsonaro escape de punições no caso das joias sauditas, retiradas do acervo da União e vendidas nos Estados Unidos. Bolsonaro está sendo investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e foi indiciado.

Em 7 de agosto, o TCU analisou uma ação do deputado bolsonarista Sanderson (PL-RS), que, motivado pelo indiciamento de Bolsonaro no caso das joias sauditas, pediu que Lula devolvesse um relógio de ouro da Cartier, avaliado em R$ 60 mil. Por maioria, o tribunal decidiu que Lula e outros ex-presidentes não são obrigados a devolver presentes recebidos, pois não há legislação específica sobre o tema.

Essa decisão diverge da tomada pelo próprio TCU em março de 2023, quando determinou que Bolsonaro devolvesse os artigos de luxo recebidos da ditadura saudita, com base em uma regulamentação de 2016. Como essa regulamentação não existia em 2005, quando Lula recebeu o relógio, ele não é obrigado a devolvê-lo.

O MP-TCU pretende recorrer não para exigir que Lula devolva o relógio, mas para evitar que a decisão crie um precedente que beneficie Bolsonaro no inquérito das joias. Lula já se dispôs a devolver o relógio, mesmo sem ser obrigado.

Os advogados de Bolsonaro, no entanto, já estão usando a decisão do TCU para tentar arquivar o inquérito no STF.

Em julho, o ministro Alexandre de Moraes do STF divulgou o relatório da PF que indiciou Bolsonaro e outras 11 pessoas por associação criminosa, peculato e lavagem de dinheiro. O relatório sugere que Bolsonaro liderou uma organização criminosa para desviar mais de R$ 6 milhões, vendendo joias e artigos de luxo do acervo da presidência, com parte desses valores sendo usados para financiar viagens aos Estados Unidos.

O jurista Pedro Serrano destacou que, se as alegações forem confirmadas, a situação de Bolsonaro se tornará “muito complicada”. Já o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, considerou o indiciamento de Bolsonaro “gravíssimo”, afirmando que as provas apresentadas pela Polícia Federal são “abundantes” e deixam claro que Bolsonaro comandava a venda ilegal das joias.