
Na última quinta-feira (17), a reunião do prefeito David Almeida (Avante) com líderes evangélicos, realizada no espaço Via Torres, zona Norte de Manaus, foi descrita como “um verdadeiro show de horror”, marcado pela mistura de religião, política, hipocrisia e falsas verdades.
O evento contou com uma plateia formada majoritariamente por membros das igrejas Assembleia de Deus e Assembleia de Deus de Madureira. No comício, classificado como “herético”, pastores exaltaram o nome do prefeito a ponto de quase equipará-lo a Jesus Cristo, enquanto demonizavam seu adversário no segundo turno das eleições.
O culto assumiu um caráter pseudocristão, onde “Jesus Cristo e a Bíblia perderam o protagonismo para o ‘Rei David’.” Em uma das falas mais polêmicas da noite, o deputado federal Silas Câmara (Republicanos) utilizou uma passagem bíblica fora de contexto para justificar a reeleição de Almeida, afirmando que era necessário “segurar o Espírito Santo” na Prefeitura de Manaus.
A fala de Silas, considerada descontextualizada, fazia referência ao livro de Mateus (capítulo 12, versículos 43 a 45), que fala alegoricamente sobre a importância da presença de Deus na vida do cristão. Essa retórica serviu para alimentar a ideia de que a eleição não era apenas uma disputa política, mas uma “guerra espiritual”, com Silas afirmando que “o inferno e satanás querem enganar os cristãos para tirar um servo de Deus da cadeira de prefeito”.
Outro ponto criticado foi a orientação dos pastores para que os fiéis comparecessem ao evento vestindo camisas do Brasil, em verde e amarelo, em uma aparente tentativa de associar David Almeida aos valores defendidos pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), confundindo os eleitores mais desatentos. Contudo, expôs-se o contraste entre essa imagem e o apoio que David Almeida tem recebido de políticos ligados à esquerda, como os senadores Eduardo Braga (MDB) e Omar Aziz (PSD), e de partidos como a Rede e o PT, que anunciaram publicamente apoio à sua reeleição.
A incoerência de pastores que, em nome de Almeida, estariam promovendo uma “comunhão da luz com as trevas” foi destacada, o que vai contra os ensinamentos do apóstolo Paulo, que condena esse tipo de aliança em 2 Coríntios 6. Essa tentativa de atrair o eleitorado da direita ao se associar a líderes evangélicos foi um “tiro no pé”, considerando as reações negativas nas redes sociais e a insatisfação visível do público.
Além disso, essa estratégia parece ser uma evidência de que o “voto de cajado”, antes uma realidade poderosa dentro das igrejas evangélicas, já não tem o mesmo impacto. Curiosamente, no mesmo dia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em um evento em Camaçari (BA), fez uma declaração igualmente controversa, afirmando que “ninguém foi mais de esquerda do que Jesus Cristo”, reforçando a mistura entre religião e política, mas com um viés oposto.
Histórico de Silas Câmara
Silas Câmara, deputado federal desde 2003, é uma figura controversa no cenário político nacional. Embora tenha assumido pela quarta vez a liderança da Frente Evangélica no Congresso, um grupo influente com 203 deputados e 26 senadores, sua trajetória é marcada por escândalos e irregularidades.
Um dos episódios mais notórios envolvendo o deputado foi a prática conhecida como “rachadinha”, onde Silas confessou que retinha parte dos salários de seus funcionários em Brasília. Essa prática, altamente criticada e ilegal, manchou sua reputação, levantando questões sobre a ética de sua atuação política.
Além disso, Silas Câmara foi alvo de investigações por uso indevido de recursos eleitorais. De acordo com auditorias, uma parcela significativa das despesas de sua campanha para reeleição, cerca de 396,5 mil reais, foi utilizada de maneira irregular, particularmente em voos que não teriam ligação com sua agenda eleitoral. Esses voos representaram 12,73% dos 3,1 milhões de reais que ele recebeu para sua campanha, levantando suspeitas sobre o real propósito de tais despesas.
Mesmo com essas acusações, Câmara continua a exercer grande influência no Congresso, especialmente entre os setores mais conservadores e religiosos. Contudo, sua posição à frente da bancada evangélica contrasta com as denúncias de irregularidades e práticas questionáveis que ele carrega ao longo de sua carreira, o que gera críticas, até mesmo dentro dos círculos cristãos que ele representa.